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Eu apenas ouço música, leio e reflito

Eu apenas ouço música, leio e reflito. De todas elas a mais difícil, por sua imensa e tediosa espacialidade, é refletir. O Tédio é um poderoso catalisador para alguns; mas na maioria esmagadora do tempo ele simplesmente derrota toda vontade de fazer qualquer coisa que seja. No entanto muitas guerras não foram engendradas, muitos amores não aconteceram e muitos livros jamais foram escritos pois estávamos muito entediados para procurar uma forma de fazê-lo.

Eu respeito o tédio, como respeito a condição de um convalescente; o tédio foi aquilo que todos os grandes tentaram evitar quando começaram a fazer suas obras. Por causa do Tédio e sua prima Preguiça muitas vezes deixamos de fazer as coisas, e para derrota-los muitas outras coisas foram feitas. Assim, eu não fico surpreendido com a aparente volta sem fim que tenho de dar para me convencer a escrever ou aprender uma coisa nova — as coisas pioram muito antes de melhorar. A curva do aprendizado é isso mesmo, uma curva, e eu tenho que aceitar sua oscilação.

Para isso preparo terreno. Tento lembrar dos bons motivos para estar vivo. Tento lembrar porque estou vivo. “Os livros, os filmes e os games não se usarão sozinhos”. Então, as especificidades surgem, é fim de semana, olha o tanto que já fiz; é novo mês, no final deste mês tem passeio no campo; os amigos ainda são amigos, e quem não é não faz diferença; até as dores das circunstâncias estão menores, e o dinheiro não parece assim tão impossível de se conseguir; vou trabalhar e depois vou trabalhar, isso é tudo. Enfim, um dia de cada vez e preenchemos uma vida.

Que muitas questões permaneçam sem resposta não me entedia mas enchem meus olhos de luz e admiração: o universo se desdobra gentilmente à minha imensa insignificância.

Falando dos sonhos, demo-nos conta quase ao mesmo tempo de que certas estruturas sonhadas seriam formas correntes de loucura por pouco que se mantivessem na vigília. Sonhando nos é dado exercitar gratuitamente nossa aptidão para a loucura. O jogo da amarelinha (Cortázar, Julio)

Lembro destes dias em que estivemos fora da cidade; um dia no campo. Não houveram arroubos de paixão, coisa que eu busco frequentemente, e que é penoso, que não sei se o faço por mim ou pelos outros. Já não faço mais aquelas coisas que fazia antes mas isso não me redime na mesma extensão que as necessidades são diferentes agora; antes eu queria experiências, qualquer que fossem, hoje quero apenas as que valem. Penso antes de agir muito mais do que antes, e se 80 por cento do tempo isso é útil e prazeroso, somente 20 por cento das outras vezes ele implica em algum problema — simulacros, hesitações, heurísticas e por aí vai.

Estive lendo sobre Geralt de Rívia conhecendo Ciri, ainda menina, princesa, e ele estava contando uma história para ela dormir. Uma metalinguagem escancarada, a história de Geralt não tem moral no final, como a historia maior que o autor conta. E ainda assim nos entretemos. Outros tantos eventos na vida também, não tem que levar a lugar algum nem dar nenhum tipo de salvação, mas apenas nos entretêm — e, saltando do popular ao erudito, cito Beckett que diz que o homem vai do útero ao túmulo e no meio tempo o coveiro cava a sua sepultura. Minha vida já está escrita e aceito meu destino, ciente de que isso não me isenta de nenhuma responsabilidade.

Comprei O Estrangeiro do Camus por dois reais na loja de livros eletrônicos. Deve ser por isso que estou tocando em temas tão pesarosos. A verdade é que eu estou passando por um momento de pesadas mudanças no meu coração e meu lugar no mundo, desde minha compreensão até meus relacionamentos cotidianos; eu queria ter algo a que me agarrar, alguma luz para me guiar, mas quando penso nisso vejo que estou sendo redundante — a cada um seu próprio caminho e, na minha imensa e infinita ignorância, evitar os buracos já é um grande ganho.

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