Meu primeiro romance foi Morte no Nilo, da Agatha Christie. Meus pais estavam visitando minha cidade natal nas férias, Iguatemi, no Mato Grosso do sul, e peguei da minha Tia Janete, creio, o livro. Passei duas semanas na cama lendo-o, sem parar para nada.
Não que eu não gostasse de sair ou coisa assim. O final da tarde naquela cidade, e mais ainda, naquele hotel velho de minha avó, era lindo. Havia marca do tempo nas paredes e nos rostos. Havia uma árvore que deixava suas flores e bolotas pelo chão toda manhã e eu adorava. Haviam velhinhos jogando dominó e eu — a criança entre crianças vivendo isso, olhando isso tudo sem pedir muito, sendo levado, levando-se.
Foi o começo de minha vida de leitura, aquelas férias, não sei quantos anos tinha. Sei que gostei muito da Agatha Christie e do romance policial. Gostei mais ainda do Hercule Poirot, de como ele não era bonito nem forte nem nada, pelo contrário, era meio arrogante, mas extremamente esperto.
Não entendia muitas palavras que a escritora usada, e muitas expressões em outras línguas, mas mesmo assim eu avançava sem parar. Até hoje me lembro do silêncio que se seguia quando eu lia, deitado na cama, parecia que até a vizinhança queria ler em silêncio. apenas os sons naturais da cama e da madeira. Quando acabei o livro foi como um filme se fechando na minha frente, eu revendo tudo e um imenso alívio tomando conta. Por isso que é tão importante acabar os livros que começamos.
Li quase que todos os livros dela pela nova fronteira, nos anos que se seguiram, uma cortesia do meu amigo Samer. Foram quase oitenta, posso dizer um tanto orgulhoso. Não lembro de quase nenhum com detalhes, mas sei que foram eles, todos estes livros que me ensinaram a ler.
Não que eu realmente saiba.
Publicado originalmente em malho-em-medo.blogspot.com. Junho de 2010