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Leituras Clandestinas III

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Para a ética estoica, que despreza qualquer capricho hedonista, a virtude é um dever e — me arrepio — o sábio que não consiga, devido a força maior, comportar-se de maneira virtuosa, é obrigado a recorrer ao isolamento absoluto dos outros homens e, se as coisas realmente não andarem bem, ao suicídio. Lições de felicidade (Gaspari, Ilaria)

Durante o retiro de meditação, as páginas de "Lições de Felicidade" de Ilaria Gaspari não foram apenas lidas, mas vivenciadas. As reflexões de Gaspari, tingidas de estoicismo e introspecção, ecoaram nos silêncios e nas descobertas pessoais que permearam aqueles dias. Seu apelo à suspensão do julgamento e à serenidade em face da incerteza não foi apenas um conceito, mas uma prática diária.

A obra de Gaspari trouxe à tona a ética estoica com sua crua rejeição ao hedonismo, colocando a virtude como um dever inegociável. Este trecho particularmente me fez refletir sobre o peso das escolhas e a solidez que a virtude deve ter em nossa vida, mesmo quando isolamento ou extremos são as únicas saídas visíveis.

Durante o retiro, abracei a aceitação pragmática da realidade, uma ressonância do princípio grego 'anechou kai apechou' — suportar e abster-se. Essa filosofia se traduziu em uma prática de transformar dores e desconfortos em oportunidades para o crescimento pessoal. Curiosamente, encontrei em mim uma veia epicurista, uma inclinação para apreciar os prazeres simples da vida e evitar conflitos desnecessários, como a dor e o sofrimento. Contudo, à medida que a meditação aprofundava minha percepção da impermanência (anicca), ficou mais desafiador ignorar que a dor e o sofrimento são componentes inescapáveis da existência humana.

Nesse processo, descobri um equilíbrio entre o epicurismo e o estoicismo, especialmente a ataraxia — a tranquilidade da mente que os estoicos valorizavam. Essa busca pela serenidade diante das dificuldades foi iluminada pelos ensinamentos de Epiteto, que Gaspari destaca em seu livro. A sabedoria de aceitar o que não se pode mudar, enquanto se aprecia a alegria nos pequenos aspectos da vida, tornou-se uma fonte de inspiração constante para mim.

«Deseje apenas o que sabe que vai acontecer», escrevo, e finalmente consigo ser clara, mesmo que tenha esgotado todo o espaço do post-it e, parece-me, também os meus recursos. Lições de felicidade (Gaspari, Ilaria)

Curiosamente, essa leitura refletiu minha própria jornada de introspecção. A abordagem de Gaspari sobre o isolamento, como resultado da dedicação ao estoicismo, parecia uma descrição da minha experiência no retiro. Em um silêncio quase tangível, a solidão tornou-se um espaço para um mergulho profundo em mim mesmo e no mundo.

Gaspari explora a autenticidade humana com uma honestidade que toca o coração. Seu estilo, que lembra o autoficcional, convida a uma reflexão sincera sobre nossas imperfeições e medos. A autenticidade da sua narrativa me fez imaginar o potencial cinematográfico do livro, algo na linha da animação introspectiva de "Persépolis" de Marjane Satrapi.

O livro também foi um espelho para minhas lutas internas, especialmente no que diz respeito à autocompaixão e ao perdão. Após um encontro difícil com meus pais, encontrei nas páginas de Gaspari uma linguagem para a autocompaixão que eu estava começando a cultivar na meditação. Sua interpretação da ética estoica como um meio de enfrentar adversidades com dignidade me ofereceu um caminho para entender e aceitar minhas próprias lutas.

~~Ao tecer essas reflexões e leituras, não apenas criei um micélio intrincado de pensamentos, mas vislumbrei uma teia mais complexa que articula a natureza humana, a busca pela verdade, a aceitação da realidade e a busca pela autenticidade.~~

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