O paradoxo da região beta explica por que pessoas podem sofrer mais com incômodos leves do que com situações intensamente desagradáveis. Pequenos desconfortos não geram ação imediata, permitindo que se prolonguem, enquanto situações graves desencadeiam respostas rápidas e eficazes.
Eu deixei um cisco entrar no meu olho em janeiro deste ano enquanto limpava o teto de casa sem óculos de proteção. O cisco me incomodou de imeditato, e apliquei água para aliviar - e com os dias achei que sairia normalmente - e que eu poderia tranquilamente esperar por isso.
Incômodos menores, como um emprego insatisfatório ou um ambiente de moradia pouco agradável, frequentemente são ignorados. Isso ocorre porque a mente subestima o impacto a longo prazo desses pequenos problemas, levando a uma complacência que permite que eles persistam.
Ontem estive em uma oftalmologista que retirou o cisco em um procedimento que durou cerca de dez minutos. O alívio é indescritível. Eu poderia, segundo ela, ter criado uma camada de proteção sobre o cisco que só se removeria com cirurgia. Mas muito mais do que isso - há seis meses que funciono basicamente com o olho esquerdo - para ler, navegar no mundo, pedalar e escrever. Eu acordei muitas vezes com o olho vermelho já, remelento e dolorido. Mas algo me impedia de ir fazer alguma coisa - um senso de acomodação que me obrigava a cuidar de outras coisas antes - e que dizia que eu poderia suportar e com sorte expelir o cisco.
Pessoas tendem a acreditar que sentimentos intensos duram mais. No entanto, situações extremas desencadeiam mecanismos psicológicos de defesa, resultando em uma recuperação mais rápida do que em casos de desconfortos menores, que não ativam esses mecanismos.
Felizmente, como descobri ao conhecer este conceito de Paradoxo da região-beta, esse sofrimento imenso poderia acabar se eu enfrentasse ele de uma vez. Apesar disso, penso que poderia ter encerrado isso com pelo menos cinco meses de antecedência, e paira ainda sobre mim a dúvida da recuperação deste olho - cujos vasos sanguíneos precisam recuar para contribuir com minha saúde geral. Eu ainda vejo com algum grau de desfoque por esse olho - e talvez precise de óculos.
A inércia de decisão contribui para a persistência de situações levemente desagradáveis. A ausência de custos imediatos e o viés do status quo dificultam a mudança, fazendo com que pessoas permaneçam em empregos insatisfatórios ou relacionamentos mornos.
Eu penso no Joel, meu pai, que faz sessenta e quatro anos hoje. Ele teve uma vida dura, e combinou com minha mãe de não contar que era meu pai genético - mas me criar como filho. Esse acordo funcionou por bons dezoito anos, quando ele arrancou a ilusão de uma forma impactante.
A tendência de priorizar o presente sobre o futuro também explica a falta de ação em face de desconfortos menores. As mudanças exigem um custo imediato, enquanto os benefícios são percebidos apenas no futuro, muitas vezes levando à inação.
Dentro do contexto apresentado pelo paradoxo da região Beta, eu consigho entender que quem sofreu não fui eu, mas ele. Isso porque ele suportou mentir por dezoito anos, mas me revelou a dura verdade de forma rápida - dolorosa, é verdade, mas que consegui superar efetivamente em uma semana ou duas. No fim das contas foi a melhor forma de me ajudar a superar e principalmente, me emancipar.
Para ele escrevi essa mensagem curta de parabéns.
QUERIDO JOEL
Hoje você completa 64 anos. Faz 6 meses que não conversamos, e quero aproveitar essa data especial para te parabenizar e reconhecer a importância que você tem na minha vida.
Aprendi muito com você: desde consertar coisas até a importância de ser teimosamente ético. Você sempre foi um exemplo de homem trabalhador e criativo. Graças a você, aprendi a resolver problemas práticos e a ser independente.
Sei que tivemos nossas diferenças e momentos difíceis, mas quero focar nos valores positivos que herdei de você. Levo comigo a vontade de aprender, a busca pela verdade, e a capacidade de admirar a beleza e ter esperança na vida.
Parabéns pelo seu dia. Obrigado por tudo.
Com carinho,
WALKER